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Big Ode #2, 2007

A ‘Big Ode #2: Poesia e Imagem’ (Julho 2007) foi uma edição especial em forma de caixa e teve 150 exemplares. Com o tema ‘A Viagem’ os autores participaram enviando material em suportes diversos e incluiu um CD dos Ventilan, gravado em estúdio pelo Fernando Gomes. Recordo bem o lançamento na recém-inaugurada Fábrica de Braço-de-Prata, na altura as minhas esculturas ‘Babilónias’ estavam expostas numa parede na Sala Deleuze. Houve concerto dos Ventilan, onde fiz uma breve introdução: reencarnei na maravilhosa Mrs Florence Foster Jenkins em playback, fui vestida a rigor com asas de anjo e o som esteve a cargo do Luis Germano. Depois o Nuno Moura leu muito bem Boris Vian (aliás, foi uma tradução em português de ‘Je Suis Snob’) e o concerto teve como ponto alto a leitura de ‘A poesia dá dinheiro a Portugal’ com o Henrique Manuel Bento Fialho a dar tudo na guitarra. Além dos Ventilan, lembro-me de estarem lá a Margarida Chambel , o Miguel Rodrigues,  a Raquel Coelho, a Sara Franco, o Tiago Veiga, e não só. Como também houve concerto dos irmãos catita noutra sala, às tantas o Manuel João Vieira de viola em punho dedicou uma serenata à Sara Rocio. Não sei como o Henrique Matos, que se passeava com a capa de um single do Demis Russos a tira colo, convenceu o Manuel João a ir para o palco tocar piano e começou no microfone a dizer um longo poema do Tiago Veiga. Ele tinha apenas um papelinho tipo cábula na mão e como estava a fumar, colocou o cinzeiro no topo da careca. A Sara ao fundo da sala preocupada fazia gestos para ele não deixar cair o cinzeiro, volta e meia ele deitava lá cinza, sem parar de dizer o poema e aguentou-se até ao fim. Já às tantas da manhã, o Fernando Gomes brindou-nos com Piazzola no piano, outra surpresa inesquecível. Obrigada por esta viagem na memória Rodrigo, foi muito bom voltar a abrir a caixa do número 2 da bigode.

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Uma casa no tempo 2006

 A primeira vez que publiquei textos foi numa colectânea de contos da Companhia do Eu, escola criada por Pedro Sena-Lino em 2005, onde também dei aulas de introdução à pintura e trabalhei no atendimento aos alunos. Tudo se passava em horários pós-laborais, tenho excelentes memórias deste espaço livre onde convivi com pessoas muito interessantes e encontrei bons amigos. Isto passou-se no período anterior ao meu doutoramento nas Belas-Artes de Lisboa. As prosas-poéticas da coletânea também estão presentes no Blog Insónia do Henrique Manuel Bento Fialho, onde colaborei entre 2005-2009. Tanto a amizade e a partilha no blog do Henrique, como a amizade do Pedro e a colaboração na sua escola foram importantes no desenvolvimento desta minha componente de resvalar para escrita, com uma presença intermitente no meu percurso, uma vez que as artes visuais são preponderantes. E como dizia Vinícius de Moraes: ‘A vida é a arte do encontro, embora haja tanto desencontro pela vida’. Tenho a sorte de encontrar pessoas bonitas e fazer bons amigos por onde vou passando, apesar de me sentir sempre estrangeira e em viagem por onde passo.

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Babilónias 2007

Conjunto de textos-visuais em  relevo com dimensões variáveis, gesso e folha de ouro, que datam de 2000-2003. Estiveram expostos na Sala Deleuze, na inauguração da Fábrica de Braço de Prata em Junho de 2007. Infelizmente, não tenho fotografia da exposição.  Na exposição  estiveram acompanhadas   do seguinte texto: 

[ descomeçar – a escultura de Maria João Lopes Fernandes]

              entre o som e a forma, o sentido. música de si mesma desconhecida, que nasce da sede, da inquietação das raízes – e se constrói, traço a traço, sobre a realidade.

              descreve o seu percurso as coisas, corpos, derrames, impermanências, até se tornar a substância do tempo, a pele da duração. a sequência desenho a desenho, que chega ao sentido, corporiza-se, e procura a origem.

              a escultura de Maria João Lopes Fernandes é música. sequência entre a forma de símbolos de sons, de cosmogonias que se descomeçam, montanhas que procuram em sede a chegada, alfabetos de palavras e línguas antes do som e da forma. música, estruturas que pedem um intérprete, que lhes ordene a forma para chegar ao som.

              prosseguindo um solitário trabalho, entre a interpretação desconstrutora do Experimentalismo e a busca interior da raiz, natureza e possibilidades da forma, encontra-se num lugar silencioso nas artes plásticas em Portugal. um lugar que o tempo revelará na sua perturbadora inquietude, coerência e incessante procura. um lugar em movimento, música de si mesma.

Pedro Sena-Lino

Salgados, Junho de 2007

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Naturezas-Mortas Sociais 2014

Em 2014, dei continuidade às narrativas visuais da série ‘Naturezas-Mortas Sociais’ iniciada em 2012, utilizando também a colagem de modo a associar elementos nas composições pictóricas, mas ampliando a escala e utilizando telas como suporte. Nesse ano apresentei algumas destas colagens na Livraria Miguel de Carvalho em Coimbra e na Galeria Cossoul em Lisboa. Na exposição da Cossoul estiveram acompanhadas do seguinte texto do meu  compagnon de route Nuno Esteves da Silva:

Não vou falar do evidente prazer de fazer que se manifesta nestas pinturas. Nem do prazer de ver que poderá resultar da nossa relação com elas. Trata-se aqui muito mais de matéria do que de virtuosismo, mas não é disso também que quero falar. Essas são dimensões que se poderão manifestar directamente a quem puder olhar. Quero falar de uma outra dimensão que estas pinturas contêm, mas que, em virtude da sua natureza, terá talvez mais dificuldade em se manifestar tão directamente. A Maria João Lopes Fernandes chama a estas suas pinturas «naturezas-mortas sociais». Sabemos que esta expressão, «naturezas-mortas sociais», a pediu emprestada ao nosso amigo Daniel Falb, que é alemão, poeta e filósofo. Cada um poderá interpretar a seu modo o porquê desta designação e o que dela se manifestará nas próprias pinturas. Não serei eu a dar a explicação correcta. Quero, ao invés disso, pensar algumas dificuldades que a sua interpretação suscita.

A própria expressão pode ser encarada como uma brincadeira ou um daqueles paradoxos que Unamuno disse ter passado a vida a criar. Mas tentaremos ver aqui mais que um jogo. E os paradoxos exprimem muitas vezes um sentido que transborda do mero paradoxo. Neste caso o paradoxo consistiria na coincidência da natureza-morta com o social.  Expliquemo-nos: poderíamos conceber uma «natureza-morta social» na qual se misturassem, no meio de frutas e legumes, objectos que manifestassem um estatuto social; mas não é de nada disso que se trata. Nesse caso continuaríamos a ter naturezas-mortas, mas com um certo pendor social. Pelo contrário, o que parece acontecer é a justaposição, num mesmo plano, de dois pontos de vista sobre o real, antagónicos e mutuamente exclusivos: a natureza-morta e o social. E, num primeiro nível, isso acontece da forma mais evidente, ou seja, pela justaposição de pequenos almoços com manifestações e a polícia de choque. O que se passa então?

Para além da justaposição das imagens temos a justaposição de códigos e géneros. E, consequentemente, de atitudes. Nada talvez mais afastado do que, de um lado, a atitude do esteta que disseca a beleza contida nas formas puras dos vegetais e mesmo de animais mortos; e, do outro, a atitude do activista que denuncia as injustiças arrastadas pela impiedosa marcha da sociedade. Ora se a cada uma dessas atitudes, isoladamente, poucas objecções surgirão, de facto, no nosso mundo democrático, já a sua sobreposição é (podemos facilmente imaginá-lo) passível de produzir algum escândalo. É que – dirão alguns – «não se brinca com coisas sérias». E não se mistura o sofrimento com croissants e compotas. Mas, saindo do discurso censório e proibicionista, temos de perguntar, antes, quem fala neste paradoxo e o que quer dizer? Que verdade se exprime aqui? Talvez, para responder a essas perguntas, tenhamos de começar por perguntar que procura de verdade habitava esses lugares aparentemente incompatíveis, a natureza-morta e o social? Enquanto lugares de produção de verdade, alguma relação se deve estabelecer entre eles, que legitimamente podemos pensar ser captada e dar sentido ao discurso destas pinturas. Tentando ser o mais breves e rigorosos possível, podemos dizer que, na natureza-morta, temos um olhar que, desviando-se do movimento do mundo, se fixa em alguns objectos transitoriamente abandonados, procurando reconhecer neles a forma pura, vazia de conteúdo, do tempo. E, no social, temos um olhar que procura reconhecer o movimento imparável, a instabilidade, daquilo que, provavelmente na maioria das sociedades, sempre foi encarado como mais estático e imutável, quando nunca o foi de facto: a organização social; as instituições. Mas é tempo de devolver a pintura ao olhar. Deixemos apenas uma última observação: talvez na relação que aqui se estabelece entre a natureza-morta e o social o paradoxo se transforme em alegoria.

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Babilónias 2000-2003

Após terminar o curso de escultura nas Belas-Artes de Lisboa em 1999, realizei durante o período de 2000-2003 uma série de esculturas em gesso com patine em folha de ouro, compostas por textos visuais semelhantes aos que tinha modelado em 1996-1997. Muitas destas esculturas encontram-se espalhadas em casa de amigos e familiares.  Recentemente restaurei as que ainda coabitam comigo. As ‘Babilónias’ foram expostas numa parede da Sala Deleuze, na inauguração da Fábrica de Braço-de-Prata em 2007, mas infelizmente não tenho nenhum registo fotográfico. As fotografias que aqui mostro são após o restauro das peças este verão.