Ontem inaugurou a exposição de pintura ‘Nem a favor, nem contra, bem pelo contrário’ de João Albuquerque, na Galeria Municipal de Montemor-o-novo. A exposição contou com a minha curadoria, ou seja, tive a honra de acompanhar o João nesta sua aventura pictórica. Se andarem nas Terras do Além (Tejo), não deixem de a visitar, estará patente até ao dia 22 de Março. Para vos abrir o apetite, fica aqui o texto que escrevi para o catálogo:
A partir do oximoro ‘Nem a favor nem contra, bem pelo contrário’ somos convidados a ver as pinturas de João Albuquerque na Galeria Municipal de Montemor-o-Novo. Quando vi fotografias das suas pinturas recentes nas redes sociais, de imediato remeti-as para o informalismo ou expressionismo abstrato. No entanto, ao observá-las ao vivo no seu atelier, a escala surpreendeu-me. O formato pequeno das suas pinturas contraria o legado destas correntes artísticas que se expandiram de forma monumental nos museus de arte moderna a partir de meados do século passado, tal como a pintura histórica já tinha invadido as paredes cegas do Louvre. A pequena escala e o formato médio das pinturas maiores de João Albuquerque são janelas abertas para outro espaço pictórico, com uma escala ‘mais humana’, intersubjetiva, que aproxima o olhar em vez de o esmagar, como acontece na pintura monumental. Estamos assim perante espaços poéticos condensados, próprios de uma peculiar expressão individual, que exigem um olhar atento num tempo pausado e introspetivo, com um corpo que se afasta do atual veloz virtual mundo audiovisual e digital.
Na pintura paradoxal de João Albuquerque habitam estruturas geométricas, ritmadas repetições de retas, linhas curvas, retângulos, triângulos, figuras híbridas ou fragmentadas, conjugadas com movimentos gestuais livres. Os gestos expressivos originam também planos epidérmicos, em composições dinâmicas onde se articulam formas com o informe, figuras reconhecíveis e rastros do seu ser temporal, que criam contrastes e encontros cromáticos imprevisíveis em superfícies texturadas ou planas. Na esteira de Magritte, mestre em paradoxos, que em ‘O Império da Luz’ (1952-53) representou a noite e o dia no mesmo quadro, João Albuquerque caminha em direção ao desconhecido na sua persistente experimentação pictórica, como se estivesse no escuro, pesquisando e conjugando elementos antagónicos, que iluminam um percurso do qual resultam estas composições breves, intensas e condensadas, que apelam a um olhar aberto a todos os sentidos. ‘Nem a favor nem contra, bem pelo contrário’ convida-nos a ver um espaço-tempo anterior às palavras, que torna o inominável possível, ou seja, a pintura aberta ao prazer da livre fruição.